Sem-terra invadem usina, banco e liberam pedágio

MST desobedece à justiça e pára ferrovia da Vale

A invasão da Estrada de Ferro Carajás (EFC), da mineradora Vale, em Parauapebas (PA), foi o ponto alto dos protestos do Movimento dos Sem-Terra (MST) para lembrar os 12 anos do massacre de Eldorado dos Carajás e pedir a aceleração da reforma agrária - em todo o País, ocorreram ações em 17 Estados e no Distrito Federal. O movimento garante que as invasões vão prosseguir.

"Continuamos mobilizados. Ocupações de terra vão continuar, assim como outras ações. A data do dia 17 é simbólica, mas a luta continua, já que as reivindicações não foram atendidas", disse José Batista de Oliveira, membro da coordenação nacional do MST.

A questão da Vale é polêmica porque a Justiça proibiu, em liminar concedida em março pela Justiça Federal do Rio, interdições da ferrovia. O juiz titular da 41ª Vara, Wilson do Nascimento Reis, já avisou que pode multar em R$ 10 mil o principal líder do MST, João Pedro Stedile, por desobedecer à determinação da liminar.

"A decisão judicial não foi respeitada", reclamou a Vale, em nota. O MST, por sua vez, respondeu que há uma tentativa da empresa para criminalizar o movimento. "A interdição não foi feita por nós, e sim pelo Movimento dos Trabalhadores em Mineradoras (MTM). A Vale quer criminalizar o MST e desviar a atenção da sociedade para seus próprios problemas, inclusive trabalhistas", disse Batista.

Na liminar, a juíza Patrícia Whately, da 41ª Vara Cível do Rio, reconheceu o direito de o movimento promover ações, desde que não sejam "atos violentos" ou interrompam a atividade da empresa. O MST e Stedile poderiam ser multados em R$ 5 mil por infração. Na ocasião, Stedile classificou a ação de "uma idiotice". A Justiça já avisou que só espera uma comunicação oficial da Vale - que, de acordo com a própria empresa, já foi enviada.

Interdição

A ferrovia de Carajás, em Parauapebas, ficou fechada durante oito horas por 1.300 manifestantes, o que chegou a impedir o teste do maior trem do mundo em São Luís. A interdição foi suspensa às 15 horas. Três horas depois do fechamento da ferrovia, a Polícia Militar paraense deslocou 450 homens do Comando de Missões Especiais com cães e bombas de efeito moral. O comandante da operação, tenente-coronel Mário Solano, recomendou cautela à tropa. Não houve enfrentamentos, mas duas pessoas foram presas depois que a ferrovia foi desocupada.

Ainda durante a interdição, cerca de dez integrantes do MST, segundo o movimento, ficaram feridos depois que um trem da Vale carregado com minério de ferro não conseguiu parar e bateu em pedaços de madeira colocados nos trilhos, que acabaram atingindo militantes. A Vale negou que isso tenha ocorrido.

Prejuízo

A empresa paralisou o transporte do minério de ferro e dispensou do trabalho em Carajás seus 5 mil funcionários. O prejuízo com a paralisação dos trens, de acordo com um diretor da empresa, chega a R$ 22 milhões diariamente. O bloqueio foi o terceiro nos últimos cinco meses. As informações são do O Estado de S. Paulo

*C/ Alexandre Rodrigues, Irany Tereza, Carlos Mendes e Wilson Lima
Em nota, empresa diz que polícia do Pará se omitiu

A Vale do Rio Doce chamou ontem as ações do MST de "criminosas e terroristas" e se queixou da polícia do Pará, que, apesar de ter sido convocada com antecedência, não conseguiu, segundo a empresa, impedir que manifestantes derrubassem um portão e invadissem, por 15 minutos, o prédio da companhia, em Belém."Embora a polícia tivesse sido avisada pela empresa sobre a ameaça, isso não intimidou os invasores que fizeram a ocupação diante da polícia", diz uma das notas da Vale.
A companhia criticou o que considera falta de ação das autoridades para conter o Movimento dos Sem-Terra. "Há muito tempo, a Vale vem alertando as autoridades que este clima de desrespeito ao Estado de direito cria um ambiente negativo para o crescimento dos investimentos em nosso País, em especial para o Pará, região que apresenta um dos maiores potenciais de crescimento e geração de renda e emprego", diz um trecho da nota intitulada MST promove mais um dia de crimes e terror no Pará.

Prejuízos

Segundo a empresa, a invasão da Ferrovia de Carajás impediu as atividades de 10 mil empregados e prejudicou o transporte de passageiros e de insumos.

A Vale negou que sem-terra tenham se ferido no local, como afirma o MST. "Ao avistar os invasores, o maquinista acionou os freios de emergência e parou a composição", diz a nota. Segundo a Vale, a ferrovia foi desocupada à tarde e o tráfego normalizado depois da chegada das Polícias Federal e Militar e do pedido de reintegração de posse, atendido pela Justiça Federal de Marabá.

Sem-terra invadem usina, banco e liberam pedágio

Além da quantidade de protestos pelo País, o Movimento dos Sem-Terra (MST) optou também por diversificar as ações, ontem, na Jornada Nacional de Luta pela Reforma Agrária e em homenagem aos mortos no massacre de Eldorado dos Carajás (PA). As manifestações incluíram invasão de praças de pedágio, ocupações da Hidrelétrica de Xingó e de um banco, caminhadas e bloqueio de estradas.
As invasões de pedágio no Paraná ocorreram durante a manhã e atingiram 11 das 27 praças do Estado. Três foram desocupadas logo depois. Os funcionários foram orientados a deixar as praças para evitar confronto. Os sem-terra levantaram as cancelas e os carros passaram sem pagar tarifa. Em nota, o movimento acentuou que "os pedágios são um dos principais entraves da agricultura camponesa e familiar".

Dezenas de integrantes do MST ocuparam parte das instalações da Companhia Hidrelétrica de Xingó, em Canindé do São Francisco (SE), a 213 quilômetros de Aracaju, até o começo da noite. Os sem-terra reivindicam o reinício das obras no Assentamento Jacaré-Curituba. O diretor de Operações, Mozart Bandeira, disse que a empresa tomou as providências necessárias - inclusive judiciais.

Cerca de 150 sem-terra invadiram a agência do Banco do Brasil em Sorocaba (SP). A agência tinha iniciado o atendimento quando ocorreu a invasão, às 10 horas. Durante 20 minutos, o acesso à agência foi bloqueado. A Polícia Militar interveio e houve um princípio de confronto entre sem-terra e policiais. Por volta das 13h30, desocuparam o banco. Em Alagoas, sem-terra ocuparam o prédio em reforma da Assembléia.

No Rio, mantiveram a Rodovia Presidente Dutra fechada no sentido São Paulo por cerca de uma hora pela manhã, próximo ao município de Piraí. Sem-terra também ocuparam agências da Caixa Econômica Federal em Campos dos Goytacazes e Volta Redonda. Na Bahia, 50 sem-terra interditaram um trecho da BA-263, em Itambé, a 566 quilômetros de Salvador. Trabalhadores rurais bloquearam duas rodovias federais e invadiram quatro fazendas no Ceará. Cerca de 300 integrantes do MST bloquearam a BR-070, que liga Mato Grosso à Bolívia. Em Pernambuco, três mil pessoas realizaram protesto nas principais ruas do Recife.

Cerca de 150 manifestantes ocuparam a Fazenda Saltinho, em Americana (SP), usada pela Usina Ester para plantar cana-de-açúcar. Em Jequitaí (MG), 500 sem-terra invadiram a Fazenda Correntes.

Os 800 sem-terra que haviam invadido o pátio em torno do prédio da Receita Federal, em Porto Alegre (RS), saíram no final da manhã de ontem. Em Ribeirão Preto (SP), a ocupação da Secretaria Municipal da Educação durou três horas. Depois de quase oito horas de ocupação da sede do Incra, em Boa Vista (RR), manifestantes deixaram o órgão. As informações são do O Estado de S. Paulo

*C/ Ricardo Rodrigues, Tiago Décimo, Elder Ogliari, Brás Henrique, Ana Luísa Westphalen, Raquel Massote, José Maria Tomazela e Clarissa Thomé e Carmen Pompeu, Monica Bernardes, Antônio Carlos Garcia, Nelson Francisco e Anderson Vasconcelos



Senadora critica ações realizadas pelo MST

Ao discursar hoje no plenário do Senado Federal, a senadora Kátia Abreu (DEM-TO) criticou as ações realizadas no dia anterior pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). O movimento realizou ocupações e protestos em diversas partes do país com o objetivo, conforme anunciou, de lembrar os 12 anos do massacre ocorrido em Eldorado dos Carajás.

"Essas invasões são abusivas", declarou Kátia Abreu.

Para a senadora, "o MST não respeita o direito de propriedade e pretende implantar no Brasil um socialismo autoritário". Ela afirmou que "tais ações são antecipadamente comunicadas ao governo e à imprensa, mas ninguém se previne nem tenta fazer algo; e esse ninguém é o governo federal".

- Não vimos em nenhum momento uma ação firme do governo para coibir esses atos - disse a senadora, para quem "o MST perdeu o foco ao ocupar locais onde há empresas que nada têm a ver com a política governamental de reforma agrária".

Kátia Abreu destacou ainda a nota divulgada pela Companhia Vale do Rio Doce, na qual a empresa protesta contra o bloqueio realizado pelo MST na Estrada de Ferro Carajás, de propriedade da mineradora, na quinta-feira. Nesse texto, a empresa declara que "ontem, dia 16, a Vale já tinha avisado à Polícia Militar do Pará sobre a possibilidade de invasão e, mesmo assim, as autoridades da área de segurança não tomaram as medidas necessárias para evitar mais esse crime". Ao comentar a nota, a senadora criticou a atuação da governadora do Pará, Ana Júlia Carepa.

Kátia Abreu também avaliou que os assentamentos provenientes da reforma agrária tornaram-se "um transtorno" para os municípios. Ela argumentou que "isso não ocorre por causa dos assentados", mas porque essas pessoas não estariam tendo acesso à infra-estrutura necessária para viabilizar suas atividades. De acordo com a senadora, o governo federal faz apenas os assentamentos e "joga para as prefeituras todo o ônus, que envolve energia, água e estradas, entre outros itens".