Inspetor de soldagem diz que foi procurado para mudar laudo do Metrô

O inspetor de soldagem Nelson Augusto Damásio, responsável pelo laudo que detectou falhas nas soldas da futura Estação Fradique Coutinho do Metrô, na Zona Oeste de São Paulo, disse que foi procurado para que mudasse os termos do relatório. Ele foi contratado pelo próprio Consórcio Via Amarela, responsável pela obra da Linha 4 (Amarela).


“Eu disse que não mudaria os termos do laudo por dinheiro nenhum”, afirmou Damásio, durante depoimento na noite desta terça-feira (6) à Comissão de Representação da Assembléia Legislativa de São Paulo, criada para investigar as obras do Metrô.

O pedido, segundo ele, teria sido feito por um homem identificado apenas como Cleber, responsável pelas contratações de inspeções. No entanto, segundo Damásio, Cleber não é funcionário da Via Amarela. Serve como uma ponte entre o Consórcio e os profissionais envolvidos na obra. Damásio disse que recebeu R$ 550 para inspecionar as soldagens do canteiro de obras da Fradique Coutinho por um dia.

“O Cleber me ligou, pedindo para que eu mudasse os termos do laudo. Disse que ao lado dele estava o Zé Ricardo, chefe de produção da Via Amarela”, contou o inspetor. O pedido foi feito no fim da tarde do dia 13 de fevereiro, segundo ele, quando a Via Amarela foi avisada pela TV Globo de que a denúncia iria ao ar no “Jornal Nacional”, o que ocorreu.


O inspetor disse que ficou surpreso com a solicitação. “É a primeira vez que vejo isso. Nunca acontece. Esse tipo de coisa é levada a sério. O que o inspetor recomenda a ser feito é acatado prontamente”, disse ele, que afirmou nunca ter trabalhado em uma obra do Metrô antes. Ele recomendou no laudo a paralisação da obra. Em seu laudo, ele diz que as falhas poderiam causar “acidentes de proporções imprevisíveis”.

Apesar de reconhecer que sofreu “pressão” da Via Amarela, Damásio disse que não lhe ofereceram dinheiro, não foi ameaçado e que o pedido para a mudança dos termos do relatório foi feito apenas uma vez.

Em nota, a Via Amarela informou que "desconhece e nega qualquer tipo de pressão exercida sobre Nelson Augusto Damásio". De acordo com o Consórcio, "não faz sentido e nem se deve perder de vista que o técnico foi contratato pelo Consórcio e, portanto, não caberia sugerir alterações no relatório de inspeção". A Via Amarela reiterou a segurança na obra da Fradique Coutinho.

Pagamento

Dono de uma empresa que tem o seu nome, Damásio contou que o contrato com a Via Amarela foi “verbal”. Por um dia de inspeção, recebeu os R$ 550 e garantiu que emitiu nota fiscal em nome do Consórcio. Segundo ele, o valor é o cobrado no setor.

O inspetor reafirmou todas as conclusões feitas por ele em 27 de janeiro, quando esteve no canteiro de obras da Fradique Coutinho para a inspeção das soldas.

“O que tem no laudo eu sustento. Não fiz nada do qual não tivesse conhecimento. Mas reafirmo que em momento algum citei a palavra desmoronamento. Eu não entendo de movimentação de solo. Só disse que, em algum momento, as soldas poderiam se romper”. Após suas conclusões, o inspetor recomendou a paralisação dos trabalhos no local.

O documento elaborado pelo inspetor revelou que as soldas feitas na estrutura metálica que sustenta a obra estavam malfeitas. “Ficamos estarrecidos com a situação e as pessoas que estavam no local sabiam disso”, afirmou o inspetor, formado pela Fundação Brasileira de Tecnologia da Soldagem (FBTS) e há dois anos no mercado.

Vazamento

O clima na Assembléia esquentou quando os deputados insistiram em saber quem divulgou para a TV Globo o laudo. "Eu não fui", repetiu por diversas vezes Damásio. "Meu trabalho não é de investigação ou de acusação. É de inspeção.", disse ele.

Depois, ao comentar sua entrevista ao "Jornal Nacional", afirmou: "Acho que falei algo que eles (da Via Amarela) não queriam ouvir". Damásio disse que só falou à imprensa depois que o Consórcio mudou a postura e, em vez de manter os elogios ao seu trabalho como no início do escândalo, preferiu "desqualificá-lo".

Fonte : G1