Camisa e camiseta de Alexandre estavam no apartamento vizinho, pertencente à irmã
Bruno Tavares e Marcelo Godoy
Havia vestígios de sangue nas roupas encontradas por peritos do Instituto de Criminalística (IC) no apartamento vizinho ao do casal Alexandre Carlos Nardoni, de 29 anos, e Anna Carolina Trotta Peixoto Jatobá, de 24. A camisa e a camiseta estavam enroladas juntas, num canto da sala. A unidade 63 do Edifício Residencial London, na Villa Mazzei, zona norte de São Paulo, pertence à irmã de Alexandre, mas está desocupada.
A polícia está certa de que as peças são do rapaz, mas decidiu aguardar o resultado dos exames de DNA antes de questioná-lo sobre o fato. Os investigadores querem saber de quem é o sangue e qual a razão para aquelas roupas terem sido deixadas no apartamento ao lado. Além disso, eles querem saber quando a camisa e a camiseta foram usadas pelo pai de Isabella.
Além das vestes de Alexandre, foram encontrados rastros de sangue em diferentes cômodos do apartamento do casal - lençol do quarto, paredes, corredor, maçaneta da porta da sala e na tela de proteção da janela em que a menina Isabella teria sido jogada. A quantidade de sangue é suficiente para a realização do exame de DNA, que deve ficar pronto, segundo o IC, até a próxima sexta-feira.
ESTRANHAMENTO
O resultado do exame com luminol - substância química que indica marcas de sangue invisíveis a olho nu - também revelou manchas na maçaneta e no interior do Ford Ka, o veículo usado pela família na noite do crime. Na quarta-feira à noite, peritos criminais voltaram ao prédio da Rua Santa Leocádia e recolheram objetos e amostras desses materiais. Todos estão sendo submetidos a análises em laboratório do instituto.
"É no mínimo estranho o casal não ter esclarecido essas marcas de sangue e a presença da roupa no apartamento vizinho em seu depoimento", comentou um perito do IC ouvido pelo Estado. "Por isso é que temos dito que a versão apresentada por eles é imprecisa."
Por ora, a equipe do IC e os legistas do Instituto Médico-Legal (IML) têm duas certezas: 1) a tela de náilon da janela foi cortada intencionalmente - primeiro com uma tesoura e depois com uma faca de serra; 2) o resultado do exame toxicológico do casal foi negativo, ou seja, Alexandre e Anna Carolina não estavam sob efeito de álcool ou drogas na noite em que Isabella morreu. Embora representem um avanço nas investigações, os resultados são preliminares e terão de ser aprofundados .
Os peritos criminais esperam a conclusão dos exames sobre as lesões encontradas no corpo da menina, sobre as manchas de sangue e a análise do local da morte para fazer a reconstituição oficial de todo o crime. Só então o casal, que está preso temporariamente por 30 dias por ordem da Justiça, será levado para o edifício em que morava para indicar aos peritos sua versão sobre os fatos. O objetivo dos peritos do IC é verificar se a versão dos suspeitos é ou não corroborada pela análise da cena do crime.
Nardoni era considerado um 'paizão' pelos amigos
SÃO PAULO - Quando entrou no curso noturno de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos (FIG), em fevereiro de 2002, Alexandre Nardoni era tido como um sujeito reservado. Na época, tinha 23 anos e estava prestes a ser pai pela primeira vez. A então namorada Ana Carolina de Oliveira, com 17 anos, estava grávida de sete meses. No dia 18 de abril, Isabella nasceu. Mas o relacionamento com a mãe da menina já dava sinais de que não teria um futuro promissor. No fim do ano, eles romperam o namoro.
No ano seguinte, Alexandre se encantou por Anna Carolina Peixoto Jatobá, uma colega de sala conhecida na alta sociedade de Guarulhos.
"Nossa, você acabou de sair de uma fria e já vai entrar em outra? Vai com calma, né?", comentou o amigo Pablo Fernando Mariano da Silva. "É mesmo, né? Eu não agüento mais repetir o mesmo nome", brincou Alexandre.
O novo casal não se desgrudava na faculdade. Em 2004, Anna Carolina Jatobá engravidou e pediu transferência para o turno da manhã. Durante a gravidez, voltava de carona com uma colega para o apartamento onde morava com os pais, num bairro de classe média de Guarulhos. Trancou a matrícula no fim de 2005, no 6 semestre, e nunca mais voltou a estudar.
Às vésperas de se tornar pai pela segunda vez, com apenas 25 anos, Alexandre se aproximou dos colegas de faculdade. Assim que caíram as formalidades, passou a ser chamado de Alê.
A imagem de sujeito fechado só persistiu para aqueles com quem não tinha intimidade. Com os amigos, era um tipo brincalhão, que repetia um bordão quando encontrava a turma. "E aí, Joe?", dizia, provavelmente referindo-se à música "Hey, Joe", de Jimmy Hendrix.
De olho no relógio
Logo Alexandre assumiu a imagem de paizão da turma. Pela forma carinhosa como falava da filha Isabella e por estar sempre de olho no relógio quando saía com os colegas à noite. Entre 2005 e 2006, eles iam a uma danceteria às quintas-feiras.
Apaixonado por motos, fazia questão de exibir as cicatrizes nos cotovelos e joelhos. Como marcas de guerra provocadas pelas quedas sofridas enquanto fazia manobras radicais nos domingos pela manhã num ponto de encontro de motoqueiros em São Paulo.
São-paulino, Alexandre adorava jogar bola. Conseguiu reunir os colegas em partidas de futebol soçaite nas sextas-feiras à noite, numa quadra no Jaçanã, na Zona Norte de São Paulo. Ele costumava levar o pai nas partidas, e brilhava mais com a bola do que com os livros.
Na faculdade, não passava de um aluno esforçado. No futebol, se beneficiava da velocidade e do porte físico avantajado para se destacar nos poucos jogos do time da faculdade. O futebol das sextas-feiras só persistiu pelo período de um mês, porque o horário noturno comprometia a assiduidade da turma nas aulas no dia seguinte.
Nos dias de semana, antes das aulas, o grupo se encontrava no saguão da faculdade para uma roda de bate-papo por 20 minutos. No intervalo, às 21h, Alexandre comia pão de queijo com iogurte na cantina.
Ele só mantinha um certo distanciamento quanto às suas relações profissionais, porque trabalhava como estagiário na consultoria tributária do pai. E nutria um certo receio de que os colegas se aproximassem dele para conseguir uma oportunidade na empresa da família.
Notícia do crime provoca choque
Depois da formatura, no fim de 2006, Alexandre se distanciou do pessoal da faculdade. Mas, recentemente, ele se encontrou por acaso com Ricardo Antônio Lázaro, de 27 anos, próximo à consultoria de seu pai. Lázaro tinha ido ao Fórum Federal quando deu de cara com o ex-colega. Em clima de descontração, papearam por cerca de 15 minutos, sentados em uma mureta da Avenida Paulista.
Pouco tempo depois, Lázaro relatou essa conversa durante encontro com outros ex-colegas num boteco de Guarulhos, na Grande São Paulo. Foi assim que a turma ficou sabendo que Alexandre estava feliz porque tinha recém mobiliado o apartamento onde morava com a mulher, Anna Carolina Jatobá.
Mas as últimas informações a respeito de Alexandre, recebidas pela imprensa, provocaram um choque. O fato de ele estar preso como suspeito de um crime bárbaro causou grande comoção na turma.
Mesmo assim, os amigos ainda guardam a imagem do cara que gostava de freqüentar churrascarias e de jogar truco nos encontros nos finais do semestre, na casa de Fernando Nobrega Pereira, de 25 anos.
Alguns dos colegas iam acompanhados pelas namoradas. Alexandre, não. Fabio de Almeida Roque, de 30 anos, que também era da turma de Alexandre, ainda guarda no computador as fotos do colega nos tempos de faculdade. A cada registro dos churrascos ou do bota-fora da faculdade - como se refere à festa de despedida, no fim de 2006 - Fabio não esconde o sorriso e faz comentários sobre o amigo Alê.
Agora, num canto do seu escritório, que fica numa rua sem saída da área central de Guarulhos, coleciona todas as reportagens sobre o caso da morte de Isabella. Ele resume o sentimento do grupo de velhos amigos:
- Nós não acreditamos que ele tenha cometido esse crime - diz Fabio.
Folha on line
Foi o vestibular de direito, mais precisamente o das Faculdades Integradas de Guarulhos (na Grande São Paulo), que cruzou as vidas de Alexandre Alves Nardoni, 29, e Anna Carolina Trotta Peixoto Jatobá, 24. O ano era o de 2002, e o casal se matriculava no primeiro semestre acadêmico, ela pela manhã, ele à noite.
Em abril daquele ano, a menina Isabella, morta no último dia 29 de março, nascia de um romance adolescente de três anos entre Alexandre e Ana Carolina Oliveira, que à época tinha 17. A relação surgiu à revelia dos pais dela. Segundo afirmam vizinhos e familiares, Alexandre não quis oficializar o relacionamento após a gravidez.
Nunca se casou com a primeira Ana Carolina, tampouco viveu junto com ela. Mas o nascimento da criança concretizou a relação paternal. Embora não tivesse autonomia financeira para sustentar Isabella --o pai, o advogado tributarista Antônio Nardoni, pagava a pensão de R$ 250 a Isabella e foi quem comprou dois apartamentos de R$ 250 mil no edifício onde a menina morreu, na Vila Mazzei--, Alexandre era um pai dedicado e afetuoso, segundo diziam parentes da mãe da menina na missa de sétimo dia, na sexta passada.
"Ainda não acreditamos. Estamos tão chocados quanto a opinião pública. Ele era um pai maravilhoso", afirmou Carolina, uma prima da mãe. Presos preventivamente desde quinta-feira, Alexandre e Anna Carolina dizem estar sendo injustamente acusados da morte de Isabella e afirmam que "a verdade prevalecerá".
Colegas de faculdade de Alexandre e Anna Carolina Jatobá, a madrasta, dizem que o casal tem um longo histórico de idas e vindas em seu relacionamento, marcado por ciúmes da nova mulher em relação à mãe de Isabella e à própria menina, o que é confirmado por parentes e vizinhos da rua Paulo César, onde o casal morava antes de se mudar para o apartamento novo na rua Santa Leocádia, cena do crime.
Mais uma vez segundo vizinhos, Alexandre e Ana Carolina, a mãe, já não tinham mais nada quando surgiu o romance com Anna Carolina, a madrasta. Ela teria engravidado logo no início da relação por supostamente sentir que a atenção do marido era dividida com Isabella, a menina. "Quando viajavam, Anna Carolina, a Jatobá, não queria que Isabella ligasse para a mãe", conta a vendedora Kassy Navarro, vizinha de casa e que também trabalha num comércio que fica ao lado da loja de um dos avós da menina, até a última sexta fechada por luto.
Segundo moradores da rua onde vive Antônio, pai de Alexandre, a família é reservada, mas quando Alexandre os visitava com a menina, os avós a recebiam no portão, com alegria. Já na casa da mãe de Isabella, Nardoni não costumava entrar.
Em dias de visita, aguardava no carro enquanto a atual Anna Carolina pegava a menina. Segundo vizinhos do antigo prédio, o casal era conhecido por brigas no apartamento onde moravam até 2007. Alexandre formou-se em direito em 2006, depois dos cinco anos regulares do curso.
Na OAB, ainda tem registro de estagiário, cuja anuidade de R$ 227,85 parcelou em nove vezes no ano passado. No último dia 9 de janeiro, renovou a licença, mas desta vez pagou à vista. Nunca prestou exame para advogado da Ordem. Já Anna Carolina, a madrasta, abandonou o curso de direito ao fim do segundo ano, em 2004. No ano seguinte foi considerada desistente e perdeu o vínculo com a faculdade. Voltou a prestar vestibular neste ano, passou, mas, como não fez a matrícula, perdeu a vaga. '[Alexandre] Foi um aluno normal, era assíduo, não faltava às aulas, cumpria as tarefas, interagia com todos. Mas não era de muitas palavras", diz a professora de direito financeiro e tributário Ossanna Chememian Tolmajian.
Segundo conta uma colega, ele se destacava na classe. Além de ser extremamente sociável e cortês, tinha uma condição de vida melhor que a do restante da turma. Durante os anos de direito, Alexandre trabalhou no escritório do pai, advogado tributarista formado em 1993 na mesma faculdade.
Anna Carolina Jatobá, diz a mesma colega, também tinha um bom padrão de vida. "Soube que eles terminaram e voltaram várias vezes", diz a aluna que pede para não ter o nome revelado.
Num dos últimos eventos promovidos pela turma da universidade, um churrasco antes da formatura, no ano de 2006, Alexandre teve de sair às pressas por conta do suposto ciúme de Anna, que teria ameaçado "dar um barraco" na frente de todos se não fossem embora, conta a mesma colega.
Diário de S.Paulo
SÃO PAULO - Embora estivessem morando juntos desde que engravidou de Pietro, de 3 anos, Anna Carolina Jatobá, 24, e Alexandre Nardoni, 29, suspeitos da morte de Isabella de Oliveira Nardoni, 5, só oficializaram o casamento civil em fevereiro deste ano, quando foram morar no apartamento da Rua Santa Leocádia, na Vila Mazzei, dado pelo pai dele. Amigos de Alexandre dizem que Anna Carolina Jatobá era extremamente possessiva e ciumenta.
- Ela ligava a toda hora para ele, querendo saber onde estava, com quem e fazendo o quê. Se ela falasse para o Alexandre voltar e ele demorasse, virava bicho - conta um deles.
Filha do meio, pretendia retornar ao curso de Direito nas Faculdades Integradas de Guarulhos (FIG) - abandonado no sexto semestre, durante a gravidez, no fim de 2005 - e trabalhar como policial federal.
Mas Guigui - apelido dado pelo irmão mais velho quando ela nasceu - é descrita por parentes como carinhosa e dedicada aos filhos. Era o que demonstrava nas reuniões de família.
- Sempre estava com um dos filhos no colo. Só parou de amamentar o filho mais velho quando o caçula nasceu - conta a prima Anna Trotta da Costa.
- Ela é uma pessoa maravilhosa, excelente mãe. Não bebe, não fuma, não tem vício. Isso (a prisão) é um grande engano - completa a tia Clarice Trotta.
Coberta com edredom
Eram 8h de ontem quando a carcereira chegou ao 89 DP (Portal do Morumbi) para verificar as quatro celas, nos fundos da delegacia. Anna Carolina Jatobá já estava acordada. Mas permanecia deitada, em cela isolada. As outras três celas eram divididas por nove mulheres. Às 10h, seguia na mesma posição, com o corpo coberto por um edredom.
"Você tomou o café?", perguntou a carcereira. "Não", respondeu Anna Carolina. "Por quê?", insistiu a funcionária. "Porque não quis. Comi bolachas que o meu pai trouxe", disse a presa. Uma hora depois, tomou banho. Às 12h40, a leitura da Bíblia foi interrompida pela chegada do marmitex. Ela avisou que não estava com fome e nem tocou na comida. O prato de carne moída, arroz e abobrinha acabou sendo doado a uma catadora de papel e à sua filha, que pediram comida no local.
No final da tarde de sábado (05), três advogados fizeram uma visita à delegacia onde Alexandre Nardoni está preso desde a quinta-feira (03), o 77º DP, em Santa Cecília, na região central de São Paulo. Apenas um dos advogados foi autorizado a entrar e conversou com o pai de Isabella por cerca de 40 minutos. Na saída, silêncio.
Na delegacia onde a madrasta de Isabella está, o 89º Distrito Policial, nenhuma visita. Só na segunda-feira (07), os advogados devem dar entrada no habeas corpus, o documento que pode colocar o casal em liberdade. Por enquanto, eles cumprem prisão temporária de 30 dias.
Perícias
Quatro perícias foram feitas no prédio onde Isabella caiu ou foi jogada do 6º andar, no sábado (29). Conclusões preliminares, divulgadas pela polícia, apontam que o buraco na tela de proteção da janela foi feito com uma faca de serra e uma tesoura. Na sexta-feira (04), o promotor que cuida do caso foi ao apartamento. Quis ver de perto o local onde morreu a menina.
Antes, ele revelou que há contradições entre os depoimentos do pai e da madrasta de Isabella. Ele também achou estranho que a dupla não tenha mencionado as gotas de sangue encontradas no local. “O sangue é visível para qualquer um que entra no apartamento, mesmo para quem não é perito. Existem gotículas de sangue no chão, nas paredes, existem algumas gotículas no corredor de acesso, na parede, uma mancha num colchão. O lençol já foi arrecadado. Enfim, qualquer leigo ali constataria isso”, disse Francisco José Taddei Cembranelli.
Neste sábado, o promotor revelou que uma reconstituição do caso deve ser feita em breve. Ainda não há data marcada. Também não se sabe se o trabalho vai contar com a participação do pai e da madrasta de Isabella.
Com informações do site G1