Júri condena três por crime que maníaco confessou e desmentiu

Acusado voltou atrás e disse ter assumido crime sob tortura; jurados não foram unânimes e defesa vai recorrer

Bruno Tavares - Estadão
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O Tribunal do Júri de Guarulhos, na Grande São Paulo, condenou ontem Renato Correia de Brito, de 24 anos, Wagner Conceição da Silva, de 25, e Willian César de Brito Silva, de 28. Acusados de matar Vanessa de Freitas, de 22 anos, em agosto de 2006, os três foram soltos em setembro, depois da confissão de Leandro Basílio Rodrigues, apelidado pela polícia de Maníaco de Guarulhos. Dias depois, Rodrigues voltou atrás e disse que só confessou sob tortura. Os réus também alegaram terem sido agredidos por policiais para admitir o crime. A decisão foi anunciada às 21h45, após três dias de julgamento.

Wagner e Renato foram condenados por homicídio qualificado e atentado violento ao pudor e devem cumprir 24 anos e 4 meses de prisão. Já o terceiro suspeito, Willian, foi condenado por atentado violento ao pudor e deverá ficar 9 anos e 4 meses na cadeia. Como forma de reparação, o trio também foi condenado a pagar 1 salário mínimo aos dois filhos de Vanessa, até que eles completem 25 anos. A defesa, logo após a leitura da sentença, informou que vai recorrer e disse ver razões para pedir “a nulidade” do júri popular.

Os três foram escoltados na saída para o 1º Distrito Policial de Guarulhos, onde aguardariam remoção para um presídio. “Isso (a decisão dos jurados) foi um absurdo. Temo pela segurança desses rapazes”, afirmou Augusto Tolentino, um dos três defensores dos réus. Na leitura da sentença, o juiz Leandro Jorge Bittencourt Cano disse que os acusados deveriam ficar presos para resguardar a ordem pública e “por causa de sua periculosidade”. “Nunca vi uma testemunha nova tumultuar o processo dessa forma”, disse, em relação a Rodrigues.

Durante os debates, a banca de acusação gastou pouco mais da metade das duas horas e meia a que tinha direito para tentar tirar Rodrigues da cena do crime. Sem provas contundentes que incriminassem os três rapazes, o promotor Levy Emanuel Magno partiu para a exclusão de hipóteses. “Se eu fosse assassinado, a polícia teria alguma dificuldade para esclarecer o crime porque lido diariamente há 16 anos com criminosos. Mas uma garota de 22 anos, que inimigos teria?”, questionou.

Cano disse que sempre considerou remota a possibilidade de um erro judicial, como chegou a ser cogitado até mesmo pelo governador de São Paulo, José Serra. O julgamento foi polêmico e a decisão final, dividida: a maior parte dos quesitos apresentados aos jurados foi definida pela votação de 4 a 3, contra os acusados. O conselho de sentença era formado por quatro mulheres e três homens. “Acredito que tenha havido um equívoco dos jurados em relação à avaliação do caso do Willian (condenado apenas por atentado violento ao pudor e não por assassinato)”, disse o promotor. Magno acredita que o acusado será novamente levado a júri, por causa desse quesito.

A acusação tentou mostrar para os jurados que havia provas de que ao menos duas pessoas estiveram na cena do crime. A tese foi construída com base no laudo necroscópico da vítima, que apontou hematomas nos braços de Vanessa. “Alguém segurou a vítima, enquanto outro praticava o abuso.”

Foram destacadas ainda três contradições entre o laudo do Instituto Médico-Legal (IML) e a versão apresentada por Rodrigues. Ele disse não ter agredido nem violentado a moça. Entretanto, os legistas concluíram que ela sofreu violência sexual e espancamento. Além disso, Rodrigues afirmou ter retirado as botas de Vanessa - mas, segundo a perícia, elas sempre permaneceram nos pés da vítima.

Já a banca de defesa, composta pelos advogados André Troesch Oliveira e Augusto Tolentino, ressaltou a ausência de provas. “Se a gente colocar duas tartarugas para correr com o Renato, elas ganham”, comparou Oliveira, referindo-se ao suposto mandante do assassinato. “Crime de mando é muito sério. Ele não tinha capacidade intelectual pra isso.” Ao longo de duas horas e meia, os advogados também fizeram menção a uma carta apreendida dentro da bolsa de Vanessa. Assinada pelo ex-namorado, o papel fazia referência ao uso de maconha. “Ela pode ter sido morta por traficantes”, especulou Tolentino.

Também houve a defesa enfática de que os três rapazes só confessaram sob tortura. Sobre os 12 laudos do Instituto Médico-Legal que não atestaram nenhum sinal de agressão nos rapazes, o advogado foi categórico. “Esses peritos estão vendidos.”

INDICIAMENTO

Também por decisão dos jurados, duas testemunhas de defesa, Rodrigo Cavalcante de Melo e Emerson Ferreira da Silva, vão responder por falso testemunho. Anteontem, a acusação havia colocado o depoimento de ambos sob suspeita. Foi dado prazo até o fim do julgamento para que se retratassem. Como isso não ocorreu - e o conselho de sentença entendeu que eles mentiram -, os dois saíram do Fórum para o 1º DP, onde foram indiciados. Mas vão responder ao processo em liberdade. Uma testemunha protegida, que também teve seu depoimento contestado pela defesa dos réus, foi liberada pelos jurados.


ENTENDA O CASO
19/8/2006
Renato Correia de Brito, Willian César de Brito Silva e
Wagner Conceição da Silva são presos, acusados da morte
de Vanessa Batista de Freitas, na noite anterior

29/8/2008
Leandro Basílio Rodrigues, chamado pela polícia de
Maníaco de Guarulhos, confessa o assassinato de Vanessa.
Renato, Willian e Wagner são soltos cinco dias depois

Ministério Público
O promotor Marcelo Alexandre de Oliveira fez a denúncia
à Justiça e pediu a soltura dos acusados. Afastou-se do caso por acreditar na inocência dos réus

Polícia Civil de Guarulhos
Delegado plantonista do 1.º DP, Paulo Roberto Poli Martins trabalhava no dia em que os três foram presos pela PM. Ele nega que os tenha torturado

Delegado-titular do Setor de Homicídios, Jackson César
Batista comandou a equipe que prendeu Rodrigues.
Foi para os policiais que o rapaz teria confessado uma
série de crimes, entre eles a morte de Vanessa. O delegado
nega que o tenha torturado

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