Fim da gordura trans é voltar à época da banha, diz indústria
RICARDO WESTIN
da Folha de S.Paulo
As indústrias rechaçam qualquer prazo para eliminar a gordura trans dos alimentos consumidos no país. O presidente da Abia (Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação), Edmund Klotz, reage com ironia ao comentar os planos do Ministério da Saúde de ver, em pouco tempo, o Brasil livre da mais danosa das gorduras.
"Se for fixado um prazo para acabar com a gordura trans, vamos ter de criar porco de novo e voltar à velha banha", afirma Klotz. "Ainda não temos nada com um resultado final parecido com o dessa gordura."
Sem tempo
A indústria reagiu dizendo que os três anos são um prazo curto demais. "A substituição demanda testes e desenvolvimento de fórmulas", afirma Fabio Acerbi, diretor de assuntos corporativos da multinacional Kraft Foods.
Já há alternativas para a gordura trans, como os óleos de girassol e de palma. O problema é que são mais caros e não são produzidos em grande escala. "E ainda temos o desafio de manter o sabor. Se você está acostumado com o seu biscoito e de repente sente um gosto diferente, você muda de marca", diz Acerbi.
A gordura trans é ingrediente de boa parte dos alimentos industrializados. Está nos biscoitos, nos sorvetes, nas margarinas, nos requeijões, nas frituras, nos salgadinhos e até nas misturas para bolos.
Surgiu como uma alternativa --acreditava-se-- mais saudável à gordura animal, por ser obtida de óleos vegetais. A gordura animal aumenta o LDL (o colesterol ruim) no sangue.
Mais que isso, a nova gordura foi amplamente adotada por ser pastosa, quase sólida, e não líquida. É o atributo que deixa a margarina cremosa e o biscoito crocante. Além disso, aumenta o prazo de validade e deixa o sabor mais agradável.
Alerta vermelho
Nos anos 90, porém, estudos científicos descobriram que a gordura trans é extremamente prejudicial à saúde. Mais até que a gordura animal. Além de aumentar o LDL, reduz os níveis de HDL (o colesterol bom).
A OMS (Organização Mundial da Saúde) recomenda que um adulto não consuma mais que dois gramas de gordura trans por dia -quantidade que se alcança comendo três biscoitos recheados de morango.
Diante dos malefícios, a própria indústria tratou de reduzir os teores. No Brasil, o grande movimento se deu em 2006, depois que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) tornou obrigatória a indicação, nas embalagens, da quantidade de gordura trans. Foi então que os brasileiros se deram conta dos excessos.
"Dois ou três anos atrás, estivemos no consumo máximo de gordura trans. Agora a indústria está cautelosa", afirma a nutricionista Liandra Freitas Marquez Bernardes, da Universidade Federal de Uberlândia, em Minas Gerais.
Três óleos vegetais apresentam nível alto de gordura
RICARDO WESTIN
da Folha de S.Paulo
A informação "livre de gordura trans" pode enganar o consumidor. A entidade de defesa do consumidor Pro Teste analisou 21 marcas de óleos vegetais, tidos como mais saudáveis que os óleos de origem animal, e viu que três tinham níveis consideráveis da gordura.
De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), a gordura trans não pode representar mais do que 2% das gorduras totais. A Pro Teste encontrou 4,62% no óleo de canola Sinhá, 3,05% no de girassol Camil e 2,07% no de milho Granfino.
Apenas 30% dos biscoitos são "zero trans"
RICARDO WESTIN
da Folha de S.Paulo
Mesmo com as pressões do governo e da sociedade, ainda são encontrados nos supermercados muitos alimentos ricos em gordura trans. Dos biscoitos vendidos no país, por exemplo, apenas 30% são considerados "zero trans", de acordo com a Abia (Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação).
Associação coloca em dúvida risco de gordura trans
RICARDO WESTIN
da Folha de S.Paulo
O presidente da Abia (Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação), Edmund Klotz, afirma que os fabricantes concordam que é preciso tirar a gordura trans dos alimentos, mas não aceitam que o governo imponha prazos.
"Ninguém está querendo envenenar ninguém. Esperamos descobrir a solução para a gordura trans em algum momento. Mas hoje não dá para falar em prazo", afirma ele. Klotz, no entanto, diz não ter certeza se as gorduras trans realmente são prejudiciais à saúde.
"A ciência pega um monte de rato e enche de margarina, o bicho morre entupido e conclui-se que a gordura trans faz mal. Pode até fazer mal, eu não sei."
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